terça-feira, 22 de novembro de 2022

‘O Diabo Feito Mulher’, 70 anos: faroeste clássico de Fritz Lang com Marlene Dietrich


Por Renato Félix*

Fritz Lang fez em 1952, há 70 anos, este faroeste em Technicolor, estrelado pela lenda Marlene Dietrich: “O Diabo Feito Mulher”, um dos clássicos da RKO no catálogo da HBO Max. Aos 50 anos, a alemã é Altar Keane, uma ex-vedete que agora dirige um rancho onde dá emprego e abrigo a tipos fugidos da polícia. E que se vê dividida entre dois homens.

Mas ela vai entrando em cena aos poucos: a história começa por Vern (Arthur Kennedy), cuja noiva é barbaramente morta em um assalto. Em busca de vingança, ele rastreia o assassino e a melhor pista diz respeito a Altar Keane, cuja história ele vai conhecendo a cada pessoa com quem ele vai conversando.

Até finalmente chegar ao rancho, junto com Frenchy (Mel Ferrer), o amante de Altar, a quem ele ajudou a fugir da cadeia. Assim, ganha um emprego, mas também fica fascinado pela mulher do novo amigo.

O carisma sedutor de Dietrich vinha fazendo sua carreira desde os anos 1930. Enigmática, petulante, dona de si, e com aquelas pernas, ela foi moldada pelo cineasta alemão Joseph von Sternberg a partir de "O Anjo Azul" (1930), em Berlim, e depois na carreira que ambos construíram juntos em Hollywood, com mais seis filmes juntos.

A atriz aprendeu direitinho e continuava querendo que a forma com que era enquadrada e iluminada por Sternberg para criar sua aura fosse usada – no caso, por Lang e seu diretor de fotografia, Hal Mohr. Isso causou tensão nas filmagens, mas, de uma maneira ou outra, o charme de Marlene está no filme.

Como o público vê o assalto fatal no começo do filme, o mistério fica por conta de como Vern vai descobrir quem é o assassino. E com quem Marlene Dietrich vai ficar no final. A paquera com Arthur Kennedy tem destaque, inclusive copiando o truque de acender dois cigarros ao mesmo tempo e oferecer um deles à parceira, que havia ficado icônico dez anos antes em "A Estranha Passageira" (1942).

A extrema obsessão de Vern se justifica: sua noiva não foi "só" morta, também foi estuprada. Isso não podia ser contado claramente na Hollywood da época, mas fica subentendido pelos lances de narrativa: o grito dela ouvido do lado de fora da loja, pela frase do médico ('Ela não foi poupada de nada") e pelo enquadramento de sua mão morta, em posição de quem lutou contra a agreessão.

Outra questão narrativa é a canção que vai intercedendo na trama, fazendo as vezes de narração. Segundo o American Film Institute, a primeira vez que um filme americano usou uma canção dessa forma ("Do not forsake me, oh, my darling", em "Matar ou Morrer", do mesmo ano, é usada de maneira semelhante, embora não tão ostensiva como aqui).

A verdade é que é um pouco difícil se acostumar com essa intervenção, mas ela começa já nos créditos iniciais, antes mesmo da trama começar, então faz sentido, de qualquer forma.
Cena do filme "O Anjo Azul"
O título nacional é de um machismo que não encontra respaldo nem na história. Por que o personagem de Marlene seria "o diabo feito mulher"? Ela é naturalmente sedutora, mas nem é desleal ou coisa parecida. Parece mais um comentário a respeito de sua persona artística, que vinha lá de "O Anjo Azul", onde isso seria bem mais adequado.

Não faz sentido, mas até aí também não faz o título original, "Rancho Notorious". A expressão não é usada no filme e o título foi imposto na RKO por Howard Hughes, que não aceitou a ideia de Lang de chamar o filme de "Chuck-a-Luck" (um jogo de roleta e o nome que a personagem de Marlene dá a seu rancho). Mas em questão de créditos, isso é o de menos. Muito pior é o nome de Lloyd Gough (nada menos que o ator que faz o estuprador assassino) ser retirado dos créditos do filme porque entrou para a lista negra de Hollywood por ter se recusado a delatar colegas na paranoia anticomunista daqueles tempos.


"Rancho Notorious". Estados Unidos, 1952.

Direção: Fritz Lang. Roteiro: Daniel Taradash, a partir de argumento de Silvia Richards. Elenco: Marlene Dietrich, Arthur Kennedy, Mel Ferrer, Lloyd Gough, William Frawley, Jack Elam, George Reeves.

Onde ver: HBO Max










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Um comentário:

  1. You mentioned the use of a song as a form of narration in the film, which was relatively innovative at the time. How did this song enhance the storytelling, and do you think it added to the overall viewing experience? Tel U

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